sábado, 5 de setembro de 2009

De repente 20

As transições são sempre difíceis, mas a da adolescência para a juventude responsável – leia-se fase adulta – é um grande desafio. Bem como na adolescência, as mudanças vão se jogando na nossa frente e a gente tem que seguir caminhando. Só que durante aquela fase, nós não temos muita consciência do mundo, até porque isso é dispensável. Nossos pais ainda pensam por nós, sabem o que é melhor, e nosso futuro próximo está decidido.

Tudo fica muito mais complexo quando passamos a controlar nossas vidas. É essa a transição. Não sabemos bem como planejá-la e enfrentar as novas situações; nossos pais já não são as pessoas que sabem tudo. Em muitos temas, temos mais conhecimento do que eles, e temos argumentos contundentes para discordar dos outros. A religião é profanada, a sordidez da realidade se impõe: a competição nos acompanha, as pessoas vem e vão e não há tempo para se fazer tudo o que planejamos.

Planejar é o temos que aprender a fazer. Desde o futuro até o próximo fim de semana. Saber conjugar as nossas vontades e horários com a vontade dos nossos amigos e seus horários. E isso tudo, sem possuir qualquer tipo de propriedade relevante: nossa renda ainda é o subsídio dos nossos pais. Portanto temos que planejar limitadamente.

E aos poucos, tomando decisões erradas, a gente vai descobrindo que o mundo é inerentemente hostil; que as hostilidades gratuitas are the new trend, não a política da boa vizinhança. Que quando achamos que sabemos desempenhar uma função brilhantemente, a gente vai ter que pedir ajuda. Que as amizades, infelizmente, não são eternas em intensidade. E que, se a gente ama, não necessariamente será correspondido. E que teremos que aprender a lidar com as injustiças.

Ah, a realidade! ela cai sobre nós intempestiva quando chegamos aos 20. Quem eu quero ser, onde quero estar, com quem. Onde estará a minha realização? Como chegar lá? E depende de nossas próprias escolhas e de nossa coragem. Só que não é fácil interpretar os acontecimentos, entender a racionalidade das escolhas alheias, para agirmos em contrapartida. Chegamos a pensar que nossas percepções são totalmente erradas, e aí caímos no zero de não compreendermos algo sequer e dá um desespero.

E temos que conviver com fatos para os quais não temos explicação e, portanto, não podemos traçar um plano de ação para enfrentá-los. E temos que viver, mesmo assim, fingindo que está ‘tudo bem’. É, não expressar as emoções para determinadas pessoas é um must do que aprendemos, mas que é difícil de assimilar.

Ah, sim, o jogo dos sentimentos – que pode ser dos casais ou mesmo dos amigos – é o mais difícil que existe. Porque a lógica é que, quanto menos tu demonstras que ama, mais a pessoa dar-te-á importância. É um jogo de gato e rato: quanto mais tu foges, mais pontos tu ganhas, porque a pessoa virá atrás de ti. Só que, se tu não dás um feedback, corre o risco de perder a pessoa. É aquele lance de as pessoas só darem valor com a ausência ou se se sentem rejeitadas anexado com o fato de que se tu não se impor, tu podes ser substituída.

E descobrimos que, assim como na economia, os fatores externos são obviamente exógenos e não podemos controlá-los. Assim, o cenário estará em constante mutação e teremos que nos adaptar imediatamente. Seguir uma rotina vitoriosa não trará necessariamente a vitória. Temos de ter jogo de cintura pra lidarmos com as injustiças, as misperceptions, as traições e a má sorte.

E a gente segue vivendo, sofrendo por não sabermos lidar com certas situações e pelas coisas que dão erradas, buscando maneiras para nos legitimar perante nossos mestres, amigos, inimigas, paixões e todo o mundo. Nessa busca desenfreada, descobrimos que estar feia ou bonita não importa, que ser simpática e boazinha não te farás reconhecida, que horas de dedicação pode ser desperdício e que ainda estamos muito longe de compreender algo. O que nos resta é continuar vivendo, reafirmando convicções, mudando de planos, trocando de roupa, buscando encontrar em lugares, músicas e gentes um pouco de nós – um pouco das mesmas dúvidas, que é o que nós somos nessa fase transitória louca.



Vitrola: Should I stay or should I go.

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